(Foto: Wikimedia Commons)

Muita gente no meu Facebook está falando do tal Estatuto do Nascituro. O que é isso? Ele já foi aprovado?
Começando pelo final: não foi aprovado, não. Esse projeto de lei ainda está passando pelas comissões da Câmara dos Deputados. Essa é a fase inicial antes de ele ir para a votação de todos os deputados (e depois do Senado). 

E o que ele diz? O que é um nascituro? Por que ele precisa de um estatuto?
É aí que a coisa complica, meu amigo.  Como diz o próprio texto do projeto, “é o ser humano concebido ainda não nascido”. O raciocínio de quem fez a lei é o de que mesmo um embrião ou um feto já correspondem a uma pessoa como eu e você, e que ela tem direitos. 

E quem propôs isso? Por que querem falar sobre esse assunto agora?
O projeto foi escrito por dois deputados, um que era do PT e outro do PHS, mas ele tem apoio do que se chama de “bancada evangélica” da Câmara dos Deputados. O curioso é pensar que esse projeto apareça depois que o Supremo Tribunal Federal tomou duas decisões que incomodaram os mais conservadores: declarou que pessoas do mesmo sexo podem se casar e que mulheres com fetos anencéfalos podem fazer o aborto legalmente.

E por que essa lei está deixando o pessoal em polvorosa?
Por vários motivos. O primeiro é que ela praticamente torna inviável a descriminalização do aborto no Brasil, e é por isso que muita gente está torcendo o nariz. Outra coisa é: a lei diz que todo bebê fruto de um estupro tem direito a pensão alimentícia. Caso o pai (o estuprador) não possa pagar ou seja desconhecido, ela diz que é obrigação do Estado dar um auxílio a essa criança até que ela complete 18 anos. 

Esse é o tal do bolsa-estupro?
Sim, isso o que as pessoas estão chamando de bolsa-estupro. Umas das críticas que se faz ao projeto é que ele não calcula quanto seria gasto no pagamento desse novo benefício. Outra é que ao obrigar um estuprador a pagar pensão alimentícia, a lei estaria forçando mulheres que foram violentadas a manter contato regular com seu agressor, algo muito cruel. 

Eu vi um pessoal dizendo que essa lei obriga as mulheres que foram estupradas a ter o filho mesmo se não quiserem. É verdade?
Não. O texto da lei é bem malfeito, na minha opinião, mas ele não muda o que já está previsto no Código Penal – que dá as mulheres direito ao aborto nos casos de estupro, de terem uma gravidez de risco ou de o feto ser anencéfalo (não ter cérebro). Pelo texto que está aí, esse projeto de lei não obriga nenhuma mulher a continuar uma gravidez causada por estupro. Se você duvida, leia AQUI. Mas tem muita gente criticando o PL (projeto de lei) porque ele é vago e pode abrir brechas para que, no futuro, o aborto seja totalmente proibido. Por exemplo, tem esse artigo (12) que diz o seguinte: “É vedado ao Estado e aos particulares causar qualquer dano ao nascituro em razão de um ato delituoso cometido por algum de seus genitores”. Esse trecho pode ser usado para dizer que mesmo uma gravidez causada por um estupro deve ser protegida.

Ainda estou muito confuso. Não é uma coisa boa proteger os bebês?Essa é uma discussão bem complexa. Tem muita gente que acha que a vida do bebê tem que ser protegida acima de tudo. Por outro lado, tem pessoas que acreditam que a mulher é quem deve decidir o que se faz com o corpo dela, inclusive decidir se vai dar à luz ou não quando fica grávida. Trocando um miúdos, o Estatuto do Nascituro é um projeto que só olha para o lado desse primeiro grupo de pessoas. É por isso que tem tanta gente revoltada nas redes sociais. 

Consultoria: José Rodrigo Rodriguez (CEBRAP/DIREITO GV), pesquisador e professor de Direito.

Saiba mais:
Texto completo da lei
Carta Capital
Folha
UOL
Estadao

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